domingo, 15 de junho de 2008

Capítulo 24

Capítulo 24

Finalmente o tempo de espera estava findo. Quando Urando saiu depois do almoço para o trabalho, sentia seu corpo pesado e sua cabeça doía. Por alguns minutos lhe ocorreu a idéia de propor adiarem aquela ação, mas sabia que de nada adiantaria temer os imprevistos deixando de fazer o que se tornava mais do que necessário, talvez nem valesse a pena, pois poderia ser tarde demais qualquer coisa que tentassem.
Também não deixava de se preocupar, o plano todo poderia falhar se seu dardo não funcionasse. Havia a possibilidade de não ser tão útil como imaginara. Sabia que essa sua invenção estava sem qualquer teste, mas agora não teria como voltar no tempo, o importante mesmo era tentar esquecer esse detalhe, mesmo que para isso estivesse colocando o velho professor em risco.
Pouco antes do horário combinado, Lin Ping estava no local da plataforma de embarque como haviam planejado. Ele sorria maliciosamente como quem sente que o momento certo para sua vingança estava inevitavelmente nas mãos dele. Não poderia deixar de entender de uma vez por todas o que realmente acontecera com Raina, talvez o plano todo fosse um fracasso, mas com toda certeza nunca mais ficaria se sentindo inútil e impotente.
Quando o horário do turno foi concluído, todos recolheram as ferramentas e seguiram para o canal de manutenção. Urando fez questão de ser o último a seguir na fila de volta para a estação. Suas pernas estavam tremendo e sua cabeça parecia que explodiria. Seus colegas subiram pela escada e desapareceram como sempre sem nem notarem a ausência do companheiro.
Pegou seu comunicador e fez a ligação para o velho professor que tentava se manter aparentemente calmo para não despertar suspeitas. O trem parou e muitas pessoas embarcaram e desembarcaram. Depois de dois minutos o trem partiu e de maneira muito ágil, Lin Ping pulou para os trilhos correndo na direção de Urando carregando as duas mochilas com os equipamentos necessários para aquela aventura.
Teriam de se afastar rapidamente, pois logo a turma do outro turno estaria chegando. Os dois se abraçaram e rapidamente retomaram o caminho na direção pretendida. Teriam de andar mais de duas horas, mas não sentiam nem seus pés tocarem no chão, corriam receosos de serem vistos. Passaram pela área automatizada ainda em ritmo acelerado e só respiraram descansados quando alcançaram a boca do túnel desativado.
- Trouxe óculos de visão noturna! – disse Lin Ping pegando no bolso os equipamentos.
- Será mais fácil já que não tem iluminação.
- Só me lembrei desse pequeno detalhe antes de sair. - Lin Ping ofegante puxou o rapaz pelo braço. – Vamos adiantar nossos passos.
Eles colocaram os óculos de visão noturna e começaram a seguir para o interior do túnel desativado. O cheiro de mofo e umidade fazia Urando espirrar o tempo inteiro. – Os olhares se mantinham atentos nos movimentos dos ratos que pareciam se assanhar com a presença de seres humanos naquele local abandonado já há muito. Urando ligou o LSO e esperou algum tempo até definir o sinal receptor, a luz começaria a piscar indicando que estariam abaixo do ponto onde Ping deixara o dardo.
Depois de uma caminhada de mais de meia hora, sabiam que deveriam ter atravessado a praça e o sinal ainda não era detectado. Urando se mostrou preocupado, algo estava errado e ele não sabia o que dizer.
- Já passamos pelo local onde deveríamos subir.
- Passamos por vinte e cinco respiradouros. – Disse Lin Ping.
- Não contei... mantive os olhos grudados no LSO. – Se justificou o rapaz. – Vamos retornar um pouco.
- O equipamento está mesmo ligado? – Indagou o professor com desconfiança.
- Quando ele liga, fica com o... – Urando deu um muxoxo. – Sou um idiota!
- O que aconteceu?
- Não desliguei o automático, ficou captando apenas sinais na memória. – Ele suspirou com desanimo. – Acho que agora vai funcionar.
- Não se mova. – disse Lin Ping nervoso. – Tem mais de uma centena de ratos enormes nos cercando.
Assustado, Urando pegou a pistola e ficou olhando em volta. Realmente os ratos se aproximavam lentamente, eram maiores do que aqueles que haviam atacado um de seus colegas. Sem perder muito tempo, Ping começou a atirar com precisão, os ratos eram bichos velozes e traiçoeiros, Urando também atirava para todos os lados. Durante um bom tempo, o túnel se iluminou com aqueles tiros, mas logo os dois respiraram profundamente aliviados, os ratos fugiam.
Ambos não se enganavam, sabiam que aquela trégua podia não durar muito, e com o caminho livre retomaram a busca do respiradouro. Dessa vez, a luz do LSO piscou, estavam captando os sinais de rádio emitidos pelo dardo. Havia uma escada velha e suja que se perdia num túnel apertado sempre para cima. Dessa vez o desespero de Urando se tornou maior, a sua fobia por lugares assim teria de ser vencida.
Depois de vestirem os coletes que haviam roubado no aeroporto, começaram a subir a escada sentindo os pés escorregarem o tempo inteiro nos degraus enferrujados. Assim que Urando alcançou a boca do pequeno túnel do respiradouro, sentiu seus braços fraquejarem e a saliva na sua boca amargar. Respirou profundamente, precisava vencer aquele medo que não sabia como enfrentar. Tentou mais uma vez prosseguir, seus pés estavam grudados no degrau da escada. Suas mãos suavam e seus olhos ardiam muito lhe causando uma vertigem.
Percebendo o pânico do rapaz, Lin Ping se aproximou, o segurou pela cintura quase no momento em que ele escorregou. Os dois ficaram algum tempo imóveis até que Urando recuperou novamente o equilíbrio da mente, sua cabeça fervia e uma dor aguda parecia lhe atravessar os ouvidos. O fracasso lhe envolvia com muita aderência, não seria possível continuar, seu corpo se negava entrar num túnel tão apertado.
- Você precisa seguir em frente! – Disse Lin Ping ofegante.
A imagem de Morga lhe veio repentinamente, ele suspirou olhando para o velho professor e sacudiu a cabeça mostrando que estava novamente dono de seus movimentos. Fechou os olhos e continuou galgando lentamente os degraus até que repentinamente sua cabeça bateu no teto. Abriu os olhos e viu diante de si uma placa amarela já enferrujada com os algarismos 180 em alto relevo.
- Chegamos! – Exclamou aliviado. – Agora só falta destravar essa porcaria.
- Vai conseguir! – disse Lin Ping logo abaixo dos pés do rapaz.
Com cuidado para não cair, Urando enfrentou o medo, suas mãos tremiam, as soltou da escada e recostou na parede. Começou a tatear a trava. Era muito antiga, com três pontos de contato. Precisava identificar os pólos para provocar um curto circuito, teria de acertar da primeira vez ou a trava ficaria danificada para sempre e jamais poderia ser aberta novamente.
Ao lembrar das conseqüências fatais de um erro, ele se encolheu e quase caiu da escada sobre Lin Ping. Não se recordava de ter fraquejado uma só vez na vida, respirou fundo e voltou a se controlar e voltou a tocar na tampa que parecia queimar suas mãos. Já sabia onde deveria conectar para provocar o curto circuito, mas ainda vacilava, era muito importante evitar um engano.
- Não podemos perder muito tempo. – Disse Lin Ping.
- Vai ser agora! – Exclamou o rapaz suspirando.
Sem pensar em mais nada, ele fez a ligação utilizando-se das facas magnéticas da própria tampa e ao escutar o barulho do engate de trava cedendo, sorriu aliviado. Sentia que seu coração palpitava de maneira incomum e seu corpo inteiro parecia encharcado de suor. O colete deveria resolver esse problema ou seria detectado imediatamente pelas câmaras de vigilância.
Abriu a tampa esperando que o corredor estivesse vazio, pulou para fora daquele buraco e ajudou o velho professor. Estavam diante do elevador, apertou o botão de chamada e em poucos segundos a porta se abriu, uma mulher muito bonita passou por eles sem suspeitar de nada, entraram e se entreolharam desconfiados, não havia indicador do andar desejado mesmo assim pediram o décimo primeiro andar. Estavam tendo sorte até aquele momento embora a jornada ainda estivesse só começando.

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