sexta-feira, 13 de junho de 2008

Capítulo 22

Capítulo 22

Urando trabalhou como se estivesse na beira de um precipício escorregadio. Pouco depois de concluir o turno, o seu aparelho comunicador vibrou, era Lin Ping novamente pedindo que ele fosse até o restaurante próximo da estação. Quando encontrou o velho estava ansioso, mas foi contido pelo convite para o almoço, de certa maneira, o professor estava resolvendo o problema que teria com o seu saldo bancário estourado.
Depois de comer, saíram passeando, Ping gostava de conversar, mas naquele momento parecia se dirigir para um lugar específico. Ao chegarem na praça Mundial, ficaram diante de um prédio robusto e antigo onde funcionava o Departamento Técnico da Polícia. Depois de olhar em volta e suspirar algumas vezes o professor olhou para o rapaz com ar sonhador.
- Trabalhei aí, por mais de vinte anos. – Ele deu de ombros. – Isso não importa, hoje não conheço mais ninguém.
- O que vamos fazer?
- Jumi me recomendou procurar Jonas, um amigo dela que trabalha no Laboratório Eletrônico. – Esse homem poderá nos fornecer sugestões sobre como burlar o sistema de segurança do Bar Lamento.
- Tem hora, que acho tudo muito fácil no que se refere ao Bar Lamento. Urando viu a expressão de descrença do professor e tentou explicar. - Nós é que complicamos as coisas. Aparece uma dificuldade e logo em seguida... deixe porá lá, deve ser loucura ou estamos sendo conduzidos ao centro de uma conspiração.
Segurando o braço do rapaz, Lin Ping deu um muxoxo e entrou no prédio. Sem perder tempo se dirigiu ao balcão de informações onde uma moça muito negra e de sorriso enorme o atendeu. Pediu para falar com Jonas Demoto e prontamente a atendente buscou no computador o terminal do Laboratório verificando se o policial estava de serviço. Depois de confirmar, solicitou a identificação de Lin Ping e passou no leitor ótico.
- Não é possível! – Ela exclamou maravilhada. – Não acredito que estou diante de uma lenda viva, o famoso Inspetor Lin Ping.
- Não sabia disso! – sorriu o professor constrangido.
- Por favor, pode seguir diretamente ao oitavo andar, sala 851. – A atendente entregou um cartão de visitante a cada um.
Puxando Urando ainda pelo braço, Lin Ping agradeceu e seguiu em frente, mas logo começou a ficar nervoso ao ver que muitas pessoas o saudavam respeitosamente como nos velhos tempos. Ele acreditava que passaria despercebido, mas a fama do detetive brilhante, ainda era muito real no Departamento Técnico. No oitavo andar, encontrou com um homem pouco mais moço que lhe fez uma reverência afetada.
- Lembra de mim? – O homem indagou. – Sou Irlan, fui seu auxiliar no caso das Igrejas Revolucionárias.
- Lembro muito bem, sua colaboração foi imensa. – Ping apertou a mão de Irlan.
- Com tudo que aprendi ao seu lado, agora sou o chefe do setor Explosivo! – Irlan respirou profundamente se despedindo. – Precisando de mim, saberá onde me achar.
Sem perder mais tempo, novamente o velho segurou o braço de Urando que olhava tudo em volta com desconfiança e o arrastou pelo corredor. Enquanto caminhavam, explicou que o chamado setor explosivo era o que desarmava bombas, coisa freqüente em grandes cidades. Ao chegarem diante da sala 851, encontraram um homem de pouco mais de trinta anos completamente calvo e barba crescida bem aparada, os aguardava.
- Meu nome é Jonas, em que posso ajudar?
- Vamos conversar na saleta? – Indagou Ping mostrando com a mão uma pequena sala com um grande sofá e duas poltronas.
Para Urando a recepção ao seu professor não poderia ser melhor, até Jonas que parecia ser um homem frio e reservado, olhava para Lin Ping com admiração enquanto escutava a solicitação para verificar os tipos de câmeras de segurança no arquivo geral da polícia. Rapidamente ele já havia entendido tudo e convidou seus visitantes para entrarem no laboratório e os conduziu até um aquário de vidro espelhado, onde havia uma dezena de terminais de computadores interligados ao sistema geral.
- Se o equipamento foi fabricado nesse mundo, vamos encontrá-lo. – Ele disse acessando uma página do programa. – Puxem cadeiras pra perto, vão ter de identificar o equipamento e podemos ficar aqui mais de uma hora.
Sem qualquer objeção, Urando pegou uma cadeira e colocou para Ping em seguida puxou uma outra para si mesmo. Em poucos minutos começaram a surgir páginas com fotos das câmeras, que Jonas excluía da relação a cada negativa do rapaz e do velho. Depois de mais de cinqüenta minutos de pesquisas, já haviam consultado todos os modelos fabricados e não encontraram nada.
- Descrevam essa câmera. – Pediu Jonas.
- Acho que Urando pode descrever com mais detalhes! – Disse Lin Ping sorrindo.
O rapaz fez uma descrição minuciosa, do formato e da maneira como ela girava e os locais onde estavam localizadas. Jonas escutava olhando para o vazio enquanto coçava a barriga e só quando a explanação foi concluída, ele maneou a cabeça de deu um muxoxo.
- Já vi uma assim, se não me engano no Bar Lamento. – ele olhou em volta. – Esse tipo de equipamento, ao que me parece foi projetado com exclusividade não possuímos qualquer registro oficial.
- Estamos perdidos! – Exclamou Urando com desanimo.
- Sou capaz de apostar que funciona pela sensibilidade automática. – disse Jonas pensativo.
- O que isso quer dizer? – Indagou Ping.
- Tenho quase certeza que ela registra a presença das pessoas por meio de sensores de calor e em seguida faz a seleção pelo batimento cardíaco acelerado pela adrenalina. – Jonas começou a demonstrar satisfação em expor suas teorias. – Ela tem o formato de um olho, o que indica sensibilidade ao calor, a pequena antena em forma de pirâmide no alto não deixa dúvidas, é o sensor de batimentos cardíacos. Modelo impressionante ainda sem uma fabricação conhecida.
- Faz sentido! – Disse Ping coçando o queixo. – Muito obrigado Jonas, ficamos lhe devendo essa.
- Foi com prazer que atendi uma solicitação do grande Lin Ping. – ele levantou-se fazendo uma reverência.
- Onde fica a sala de Irlan Kosta? – indagou Ping.
- No fim do corredor. – Disse Jonas sem pestanejar.
No corredor, Urando tentou saber o que o professor pretendia, mas ele não lhe respondeu, apenas pedia para esperar. Quando Irlan recebeu Lin Ping em seu gabinete, parecia exultante com a visita. Os dois conversaram alguns minutos sobre o trabalho Esquadrão de Bombas e quando Ping disse que precisava de dois coletes térmicos de desarme a expressão de Irlan mudou repentinamente. O sorriso desapareceu deixando apenas uma máscara de incredulidade.
- Não posso fazer isso! – Disse nervoso. – você sabe que não posso...
- Então me diga como eu posso roubá-los! – Lin Ping deu de ombros.
- O que pretende com eles?
- Estou fazendo uma investigação para oferecer um novo projeto e preciso deles para comparar com o que tenho e descobri falhas. – Mentiu o professor de maneira calma.
- Sei que está me escondendo algo, mas nossa amizade me faz esquecer muita coisa. Oficialmente não tenho como lhe oferecer uma ajuda imediata, mas sei de uma maneira que não vai me comprometer. – Irlan deu um sorriso malicioso. – No aeroporto, existem cinco conjuntos de reserva que quase nunca são utilizados, ficam guardados no setor automatizado de carga pesada. – ele coçou a cabeça. – Difícil será penetrar na segurança deles sem uma autorização, se me der uma semana garanto que arrumo tudo.
- Agradeço sua colaboração mais uma vez, não precisarei da autorização, resolvo por minha conta. Você não disse nada, saberei guardar sigilo. – Disse Lin Ping estendo a mão para Irlan.
A cabeça de Urando estava pronta para explodir, repleta de interrogações absurdas. Quando saíram do prédio da Polícia Técnica, resolveu que não andaria um só centímetro sem saber o que o velho professor planejava. Estava se sentindo pisando descalço sobre um braseiro e não conseguia acompanhar o raciocínio.
- Pra que servem esses coletes?
- Vou explicar! – Ping olhou em volta. – Quando um perito vai desarmar uma bomba, fica nervoso, a adrenalina faz com que sua temperatura externa reflita sua descompensação orgânica. Alguns detonadores são preparados para perceber a curta distância qualquer mudança de temperatura brusca e sensíveis ao batimento cardíaco, as pulsações são fatais se ao serem tocados o manipulados não estiverem dentro de um certo limite. Para isso, o colete é fundamental, equilibra de maneira artificial a temperatura do corpo e mantém abafada a pulsação.
- Entendi...! – O rapaz deu um muxoxo. – Vamos enganar a vigilância.
- Tudo se tornou simples, vamos ter de agir por nossa conta, toda a colaboração disponível já nos foi dada. – Ping respirou profundamente. – Ainda é capaz de interferir em programas bloqueados?
- Não gosto de fazer isso, podemos ser presos! – Disse o rapaz assustado. – Aonde acharemos um terminal?
- No aeroporto, vamos entrar numa máquina de conversa a distância, alugamos por uma hora e você faz o serviço.
- Vamos forjar nossa autorização?
- Entendeu tudo! – Lin Ping pousou a mão no ombro do rapaz. - O equipamento nos dará pouco mais de quarenta minutos, você terá de ser rápido e dispor do tempo de aluguel do terminal o mínimo possível, precisaremos dele conectado. Pela minha experiência, o setor automatizado entra na checagem de liberações depois de vários procedimentos, quando ele concluir que tudo é um embuste, já teremos feito o serviço.
- Como sabe dessas coisas?
- Investiguei uma quadrilha de contrabandistas, era assim que eles entravam no setor de carga, o meu auxiliar na época foi Irlan. – O velho sorriu. – Vamos nos apressar, o tempo perdido pode ser muito valioso.
- Não alteraram o sistema depois de tanto tempo? – Indagou Urando seguindo o professor.
- Eles mudaram apenas o código de acesso, seria muito caro investir numa sofisticação do sistema de segurança, não valia a pena embora eu tenha recomendado e para nossa sorte, desprezaram a sugestão. – Lin Ping olhou para o céu. – Acho que vai chover novamente.
Eles pegaram o trem e foram diretamente ao aeroporto. Como Lin Ping previra, executaram a operação de maneira segura e rápida, a facilidade com que Urando manipulava os programas no computador estava sendo uma arma poderosa para o sucesso. O velho professor sabia exatamente onde encontrar os coletes e pouco antes da meia noite já estava retornando para casa.
Por causa do avançado da hora, resolveram deixar para estudar os coletes e adequar as suas funções orgânicas pessoais para o dia seguinte quando Urando concluísse seu turno de trabalho. Eles se despediram na porta do prédio de Lin Ping que recomendou que o rapaz não tentasse alterar nada nos coletes sem lhe consultar.
- Vamos entrar no Bar Lamento quando você trocar de turno. – disse Lin Ping com ar pensativo.
- Estou muito ansioso!
- Ótimo...! Urando... vamos invadir... nossa ação, será no primeiro dia do seu turno vespertino, executaremos a manobra de invasão. – Repetiu o professor também excitado.