sábado, 7 de junho de 2008

Capítulo 15

Capítulo 15

Por todo o seu turno daquela manhã, Urando trabalhou sem reclamar de nada, no entanto aguardava ansiosamente a hora de voltar para casa, estava sentindo o sabor dos lábios de Morga, suas mãos lhe correndo pelo corpo e até escutava a sua voz sussurrando ao seu ouvido, Por varias vezes, Genaro lhe chamou a atenção para que saltasse da linha para não ser atropelado pelo trem.
Quando o turno terminou, trocou de roupa rapidamente e ao passar pela frente de uma loja de aparelhos comunicadores, olhou de lado e sorriu, não queria saber de perder um só minuto precioso para chegar ao lado de Morga, mesmo assim entrou e comprou um modelo simples, o único que seus créditos lhe permitiam. Não gostava de falar com aparelhos, mas de uma coisa estava certo. Passar pela experiência desagradável de ficar falando com uma máquina, lhe despertara para o prazer de ter alguém para esperar ou ser esperado por ela.
Ao chegar diante da porta do apartamento de Morga, seu coração explodia de ansiedade. Quando ela abriu a porta, ele não se conteve, a beijou com tanta fúria que a moça se assustou em seguida a abraçou com ternura e desabou num pranto sincero. Acreditava ter culpa por não ter conseguido salvar a vida de seu amigo Bernardo, ele se metera em alguma confusão por causa da solidão. Sem medir as palavras, ele contou suas preocupações para Morga que escutou em silêncio.
O rapaz estava completamente transtornado, sentia a impotência diante do que achava ser um problema sem solução. Penetrar nos arquivos do Bar Lamento, talvez indicasse algo que Bernardo tenha deixado escapar sobre seu paradeiro, mas Urando não nutria nenhuma esperança em conseguir isso.
Como sua amiga Jumi lhe dissera, a polícia não se interessaria pelo caso e mesmo de maneira informal, ela estava impedida de colaborar. Encontrar o amigo era um interesse apenas dele. O que fosse possível ser feito, estava em suas mãos e o tempo se tornara uma arma apontada contra seu coração, sabia que o perdia a cada tentativa sem qualquer êxito, a única informação que dispunha além de sua intuição, fora o comentário interrompido da programadora virtual na sala de clientes especiais.
Consternada com o sofrimento de Urando que falava e gesticulava de forma aflita, Morga mordia os lábios tentando não falar das idéias que se acumulavam na mente. Depois que ele silenciou e se deixou embalar no carinho da mulher amada, por um bom tempo suas lágrimas secaram e Morga aproveitou o momento para dizer alguma coisa.
- Talvez seu amigo tenha feito algo que não teve tempo para lhe contar, nesse momento contaria para você, mas sabe que não tem como se comunicar.
- Devia ter comprado logo essa droga de comunicador! – Ele pegou o aparelho novo e mostrou para a namorada.
- Qual é o numero? – Ela indagou.
- Esse aqui! – O rapaz apontou para o mostrador. – Quer anotar?
- Não será necessário, tenho memória fotográfica e...
- Engraçado, eu também!
- Somos duas pessoas estranhas, não resta qualquer duvida! – ela beijou suavemente os lábios do rapaz e começou a despir suas roupas.
Depois de relaxarem, os dois ficaram deitados e abraçados em silêncio, repentinamente ela sentou na cama e começou a se preparar para sair. Urando contemplou aquele belo corpo, frágil, mas cheio de vitalidade de contornos perfeitos. Jamais imaginara conhecer uma mulher como ela. Morga pegou a toalha limpa pendurada num cabide e antes de entrar no banheiro, se voltou para Urando com ar pensativo.
- Sei como posso tentar ajudar!
- Ninguém pode...
- Primeiro me escute, depois faça seus comentários, mas lhe peço que não faça qualquer julgamento a meu respeito, tenho meus motivos para ocultar o que lhe conto agora.
- Eu prometo! – ele tentou sorrir.
- Posso tentar obter as informações sobre a última vez que Bernardo foi ao Bar Lamento.
- Como...? – Urando se mostrou descrente.
- Eu trabalho lá como programadora na sala de clientes especiais. – Morga voltou para perto do rapaz e sentou na beirada da cama. – Não fique com essa cara de assustado, no momento não quero lhe envolver em novos problemas, peço apenas que tenha confiança, depois lhe conto tudo.
- Não faça isso, se lhe apanharem pode perder o emprego! – Urando segurou a mão da moça. – Eu confio em você, sei que não me trairia.
- Não vou fazer algo muito arriscado, apenas aproveito o horário de descanso e faço uma consulta no arquivo com uma busca pelo nome do seu amigo e ouço a última conversa.
- Não gosto de ver você envolvida nisso, algo me diz que essa história pode ser perigosa.
- O Bar Lamento não é um antro de bandidos, eu lhe dou essa certeza.
- O sistema de segurança é muito intenso e sofisticado...
- Tenho meus métodos para burlar a vigilância, fique tranqüilo. – Ela acariciou os cabelos de Urando. – Se eu notar que algo deu errado e eu estiver em dificuldades, entro em contato com você e digo apenas que “esqueça de mim”, será nossa senha.
Beijando novamente os lábios do rapaz, ela foi tomar banho, precisava pensar um pouco nos passos que teria de dar para evitar um problema ainda maior. Saber que Urando era do tipo sanguíneo O negativo lhe deixava apreensiva desde que o conhecera e ouvira aquele detalhe ser dito por ele de maneira casual.
Urando ficou o resto da tarde e quase toda à noite, angustiado por saber que Morga estava se envolvendo num assunto que ambos nem imaginavam aonde chegaria. Antes de sair, sua namorada lhe dissera que trabalhava das oito da noite até meia noite e meia, depois ficava disponível por uma hora inteira na sala de repouso onde havia um terminal e de lá faria o que precisava.
Aproveitaria esse momento de maneira intensa, já que não havia qualquer câmara de circuito de vigilância naquela sala onde só entravam para cochilar antes de retomar o expediente interno de limpeza das interferências dos sistemas auxiliares e editavam quando necessitavam os programas dos clientes novos daquele dia.
A maneira segura da moça lhe deixara menos resistente ao plano, mesmo assim não gostara de ter de depender de informações que podiam ter sido manuseadas antes do acesso de Morga. As pistas se confundiriam e o levaria a trilhar caminhos falsos. Cansado de tanto pensar em outras soluções, adormeceu segurando o comunicador a espera de um chamado inesperado.